terça-feira, 26 de abril de 2005

Compasso de espera

Por Fábio Zambeli, no site Rebote


A inatividade da seleção feminina de Barbosa é mais uma prova de que o Brasil não aproveita o privilégio de sediar o Mundial 2006

Genebra, 19 de junho de 2004.

Dia de júbilo para o basquete brasileiro.

Em uma votação secreta, o país superava a Espanha por 11 votos a 7 e era alçado à condição de sede do Mundial Feminino de 2006.

Hora de festejar. Os dirigentes, rápidos na análise rasteira, atribuíram a predileção à “gloriosa trajetória do nosso esporte”.

Exibiam efusão. Não sem razão, afinal, esperava-se que uma reverência de tal porte da comunidade internacional embalasse um ciclo virtuoso de fomento à prática da modalidade.

Traduzindo em miúdos: despontava uma espécie de balão de oxigênio para atletas, clubes e federações, que transitam perseverantes pelas UTIs da bola-laranja à espreita de sobrevida.

A 14 meses do início do Mundial, que já tem sedes pré-estabelecidas (Rio, São Paulo e Belo Horizonte), o embrião lançado em solo suíço ainda não germinou.

O pior: a convalescença caminha a passos largos rumo às categorias de base.

O revés diante das canadenses na Copa América de Porto Rico disparou o alerta já em 2004. A seleção feminina, reconhecida potência global, ficaria ausente do Mundial Sub-19, marcado para o próximo mês de julho na Tunísia.

Sinal amarelo para o trabalho de formação de novas atletas no país que ocupa um honroso – e confortável - quarto lugar no ranking da Fiba para a modalidade.

Com 579 pontos, o país só é superado por Estados Unidos, Rússia e Austrália no mapa das forças internacionais. Posto alcançado com sucessivas presenças canarinhas em pódios olímpicos e mundiais.

Não bastasse a fragilidade da modelagem de jogadoras, evidenciada no fiasco continental, o selecionado brasileiro convive agora com uma preocupante apatia.



O time adulto dá sinais de debilidade e acefalia, despreza os prodígios das quadras e das pranchetas.

A inatividade do time dirigido por Antonio Carlos Barbosa é mais um componente inquietante.

Não raro, a cartolagem alardeia o fato de o Brasil, como país-sede, ter vaga assegurada no Mundial. Até para anunciar o calendário de atividades da seleção para 2005, a CBB apregoa o passaporte carimbado ao mencionar a participação brasileira na Copa América.

O Pré-Mundial de setembro seria a oportunidade de reunir a maior parte do elenco que entrará em quadra para a briga por medalhas em 2006, já que o Sul-Americano de Cáli (Colômbia) ocorre em junho, o que inviabiliza a participação de atletas que atuam na WNBA.

O aparente desdém com a agenda de preparação para o Mundial passa pela composição da comissão técnica. Afora as questões de caráter técnico e político que envolvem a manutenção de Barbosa no comando, a CBB preserva à margem do rito preparatório figuras que certamente trariam ganhos no esforço para reconduzir nossas meninas ao pódio – caso nítido de Paulo Bassul.

Enquanto os torneios domésticos agonizam, uma verdadeira constelação de brazucas habita as galáxias do Velho Continente.

Um breve rastreamento permite elencar mais de uma dezena delas. São cinco nos playoffs italianos (Cíntia Tuiú, Alessandra, Zaine, Graziane e Micaela), outras cinco na elite da liga espanhola (Helen, Érika, Êga, Leila e Patrícia Mara), além de rebentos que migraram para a França (Mamá), Portugal (Silvinha Gustavo e Gilmara), e outras que arremessam nos competitivos torneios russo (Iziane, a caminho do Seattle Storm) e polonês (Karla).

Nos bancos de reserva, nossa escola é reconhecida fora dos tentáculos da CBB. Maria Helena Cardoso escreve páginas vitoriosas no Hondarribia, semifinalista da liga espanhola – comandando lendas-vidas da modalidade como Elena Tornikidu e Marina Ferragut.

Sem falar das “desempregadas” Vivian e Roseli, cujos préstimos ao selecionado dispensam comentários.

Vez ou outra, notam-se movimentações de bastidores – como a associação de atletas, liderada por Janeth Arcain, e a retomada do fulcro piracicabano, pelas mãos de Branca.

Ainda é pouco.

Quando o escrutínio de Genebra indicou o Brasil como base para o campeonato do mundo do próximo ano, renascia o sonho da reedição do feito de 1971, com o Ibirapuera tomado pelos torcedores e um bronze épico.

Ou, quem sabe, do revival do fenômeno pop em que se transformara a seleção de Hortência, Paula, Suzete e cia. em 1982, também com o ginásio paulistano repleto e os telespectadores antenados pela Vênus Platinada - em rede nacional e horário nobre.

Passados 10 meses da votação na sede da Fiba, o cenário não é nada alvissareiro.

Ainda há tempo para reverter o quadro. Findado o período eleitoral na CBB, faz-se necessária uma corrida contra o tempo a fim de assegurar ao torneio que se aproxima o status de grande evento esportivo brasileiro na esteira do Pan-07.

O Mundial-06 tem os ingredientes para catapultar uma corrente que injete energia no basquete nacional. Falta acioná-la.


Fonte: Rebote

Comentário: Excelente coluna do Fábio Zambeli. Uma análise perfeita!

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