quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Nômades das quadras: prós e contras do "vai e vem" no basquete feminino

Quem acha um exagero quando um jogador de futebol defende dois ou três times num curto espaço de tempo ainda não prestou atenção na vida das jogadoras do basquete feminino. Por conta do calendário irregular de competições na temporada – a WNBA, liga americana, por exemplo dura apenas três meses –, é comum ver as atletas vestindo diferentes uniformes e vivendo como verdadeiras nômades das quadras. Elas lidam com naturalidade com o fato de serem "vira-casacas" e aprendem uma série de lições nas diferentes culturas e escolas de basquete, seja nos Estados Unidos, na Espanha, na Turquia, na Rússia, ou em qualquer outra parte do mundo. Maior pontuadora e melhor jogadora da temporada de 2014 da WNBA, Maya Moore aproveita o intervalo das férias em sua terra natal para viver novas experiências e mergulhar em um universo novo. Naturalizada espanhola, a caribenha Sancho Lyttle aproveita o fato de ter começado tarde no esporte para absorver o máximo de conhecimento em cada lugar em que vai jogar e viver.

Duas vezes campeã do mundo (2010 e 2014) e eleita a "MVP" do Mundial da Turquia, a talentosa Maya Moore, de 25 anos, vem sendo lapidada desde a infância. Escolha número um do Draft da WNBA em 2011 pelo Minnesota Lynx, ela coleciona títulos desde cedo, despertando a atenção de olheiros pelo mundo. Em seus quatro anos pela Collins High School (no ensino médio), ganhou três títulos e foi considerada a jogadora do ano em 2006 e 2007. Na universidade, conquistou mais títulos com Connecticut (2009 e 2010), acumulando 90 vitórias seguidas. No seu ano de estreia pela liga americana, a ala levou a franquia ao topo do pódio, repetindo a dose em 2013. Assediada por clubes da Europa e da Ásia, ela escolheu primeiro a Espanha, onde atuou pelo Ros Casares e venceu a Euroliga em 2012. Depois, passou a atuar pelo Shanxi Rui Flame e sagrou-se campeã na China. A experiência serviu para aumentar a bagagem com diferentes escolas do basquete e experimentar uma vida completamente diferente da que levava.

- Ao mesmo tempo que é divertido, é desafiador. No mesmo que fui escolhida no Draft, eu comecei a jogar na Espanha. Fui para a China em 2012 e acho importante você atravessar o oceano para imergir em uma realidade totalmente diferente da sua, conhecer novos hábitos, povos e culturas. Além de ser algo divertido, viver em outros países te ensina sobre diferentes estilos de basquete e te força a evoluir e se adaptar rápido, afinal, as ligas duram apenas alguns meses. Aprendi muito depois que me tornei uma atleta profissional e passei a jogar internacionalmente. Toda experiência é válida. E o legal é que você acaba conhecendo muitas jogadoras, aprendendo também como se joga nos seus países de origem - contou Maya Moore, campeã olímpica em Londres 2012. 

A comida na China tem sido o mais complicado na adaptação das americanas. Com poder financeiro, o país asiático tem recrutado cada vez mais estrelas da WNBA. Enquanto a pivô Brittney Griner acaba optando por escolhas não muito saudáveis para atletas de alto rendimento, como "fast-food", pizza, batata frita, biscoito, refrigerantes e balas, Moore tenta seguir um cardápio mais balanceado, apesar de admitir sair da linha de vez em quando. Por conta dos exames antidoping (muitas carnes na China têm esteroides), Maya tenta evitar a comida local e tenta ao máximo preparar as suas refeições.

- A gente vai se adaptando. Gosto de cozinhar as minhas comidas porque assim eu tenho certeza do que estou comendo - revelou a ala, que confessou que recorreu às frituras em seu primeiro ano na China para lembrar o tradicional cardápio dos Estados Unidos. 

Os obstáculos com o idioma acabaram sendo amenizados pela presença de três tradutores (para inglês, espanhol e chinês), que trabalharam para o Shanxi. O técnico espanhol fala pouquíssimo inglês, uma companheira coreana emite apenas algumas palavras, e as chinesas não falam nem espanhol, nem coreano, só um inglês básico. Mas nada que atrapalhe o seu desempenho dentro de quadra. Enquanto muitos astros da NBA aproveitam o verão para descansar e se recuperar da temporada, é muito comum que jogadoras do gabarito de Maya e Griner passem o ano inteiro jogando em diferentes clubes e países. O salário médio de uma atleta na WNBA varia entre US$ 72 mil e US$ 105 mil, por isso, elas buscam outros rendimentos fora da temporada americana. São cifras que não chegam nem perto do que as estrelas americanas ganham na NBA. Com a crise europeia, o mercado chinês tem seduzido a elite feminina com as melhores ofertas.
Principal destaque da Espanha, ao lado de Alba Torrens, Sancho Lyttle não se importa tanto com a parte financeira. Para a ala, que nasceu na cidade de Kingston, em São Vicente e Granadinas, no Caribe, e naturalizou-se espanhola há cinco anos, a experiência no exterior é fundamental para a sua evolução. Depois de se mudar para os Estados Unidos, tocou em uma bola de basquete pela primeira vez aos 18 anos, na Universidade de Houston. Dez anos depois, já estava na WNBA e alçada a ídolo no Atlanta Dream. Um fenômeno das quatro linhas. Mas, segundo ela, nada teria sido fácil sem o contato com as escolas de basquete mundo afora.

- Vivemos realidades distintas em um único ano, mas o mais importante é o aprendizado com diversos treinadores. Como comecei tarde no basquete, tento absorver o máximo de lições para ajudar a melhorar meu jogo. Não sei muito sobre basquete e, por isso, acho que sou uma pessoa fácil de ser treinada. Estou sempre evoluindo. Muitas pessoas que começaram cedo carregam ensinamentos desde a infância, mas comigo é diferente. Gosto de estar sempre aprendendo coisas que tornem o meu jogo mais técnico e fácil. Eu fui para a Espanha (Ibiza, Salamanca e Valencia) muito crua e, desde então, já evoluí bastante, mas continuo aprendendo. O meu técnico do Galatasaray, por exemplo, é um apaixonado por basquete. Fica assistindo aos jogos da NBA e quer que a gente jogue como os homens. Em cada lugar, aprendo algo novo - analisou Lyttle, medalhista de prata no Mundial da Turquia.

Em busca da evolução, Sancho renovou com o Galatasaray para a próxima temporada da liga turca. A brasileira Érika, por sua vez, recusou recentemente uma oferta milionária do clube de Istambul para cuidar da avó. Campeã da WNBA em 2002 pelo Los Angeles Sparks, a pivô do Dream coleciona passagens por Valencia (Espanha), Mizo-Pecsc (Hungria), Club Sport Universitari de Barcelona (Espanha), Barcelona (Espanha), Ros Casares (Espanha) e Connecticut Sun (WNBA) no exterior. Considerada uma das melhores jogadoras da atualidade, acredita que já aprendeu o suficiente. Agora, além de querer ficar mais perto da família, pretende ajudar no desenvolvimento do basquete no Brasil.

- Decidi ficar no Brasil neste ano depois do fim da temporada na WNBA. Quero ajudar o basquete no Brasil, que anda muito apagadinho. No que eu puder, vou dar o meu máximo pelo esporte e mostrar para todo o mundo que o basquete brasileiro está voltando.

Fonte: Globoesporte.com

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